O acidente que poderia ter sido fatal envolvendo o turista americano Kenneth Reynes chamou a atenção para a segurança de um esporte que tem atraído cada vez mais adeptos. Vinte mil vôos de asa
O acidente que poderia ter sido fatal envolvendo o turista americano Kenneth Reynes chamou a atenção para a segurança de um esporte que tem atraído cada vez mais adeptos. Vinte mil vôos de asa-delta são feitos por ano da Pedra Bonita, em São Conrado, de onde saltaram Kenny e o instrutor Eduardo Nascimento Coelho, sábado. A prática esportiva virou negócio com vôos duplos, mas não há lei que a regulamente. Associações regionais de vôo fazem suas próprias regras e lutam para que sejam cumpridas. Mas, sem legislação, ficam à mercê da boa vontade e ajuda dos pilotos. No acidente de sábado, que pode ser visto aqui em vídeo exclusivo da TV O DIA ONLINE, o instrutor Eduardo, conhecido como Alpine, não seguiu todos os procedimentos obrigatórios antes da decolagem, esquecendo-se de checar se estava engatado na asa-delta pelo mosquetão. “Realmente falhei. Eu me distraí, porque já tinha feito o check list total, mas tive que me desprender para ligar a câmera, que não estava funcionando. Quando voltei, na pressão dos colegas para decolar rápido, acabei saltando. Já na rampa percebi que estava solto, mas não tinha como parar. Sabia que não ia agüentar até a praia. Empurrei a asa em direção às árvores, que funcionaram como um colchão para ele, e acionei o pára-quedas. Era o único jeito que tínhamos de sobreviver”, garante Alpine. Para se transformar em instrutor e voar com passageiro, o piloto deve ser habilitado e cumprir regras, mas há quem questione a eficácia da fiscalização, que atualmente é de responsabilidade da Associação de Vôo Livre do Rio de Janeiro (AVLRJ). “Não temos força de polícia, e falta legislação. As normas existentes foram elaboradas pela própria instituição, que nem sempre consegue garantir que sejam cumpridas inteiramente. Precisamos de mais apoio da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) para fazer um trabalho sério”, diz o presidente da AVLRJ, Plácido Faria. Segundo o chefe de Inspeção e Investigação de Acidentes Aeronáuticos da Anac, Luiz Rogério Castro, o papel da agência é fiscalizar as associações. Mas Plácido e o ex-presidente da AVLRJ Bruno Menescal garantem que agência é omissa. “Quando se exime de elaborar uma legislação para o vôo livre, a Anac age como se voar fosse igual a andar de bicicleta. Nenhum membro do órgão aparece aqui para controlar a prática. Por outro lado, não nos dá total liberdade de ação, porque não temos respaldo de lei”, diz Bruno. Para conseguir habilitação de piloto desportivo nível 4, que permite realizar vôos duplos, é preciso ter 5 anos de vôo solo, participação em competições de diferentes regiões e completar mil quilômetros de distância livre. Hoje, são 65 instrutores autorizados. Todos são obrigados pelo órgão a fazer vistoria do equipamento a cada 6 meses. “Não podemos confiscar a asa caso o piloto não faça. Mas temos mecanismo para impedi-lo de decolar, como os fiscais de rampa”, explica Plácido.
Quem estava na Pedra Bonita relembra com nervosismo do acidente. Mesmo apreensiva, a fotógrafa Luiza Reis deixou o instinto profissional falar mais alto e gravou o momento da queda. “Eu estava esperando para voar quando o cara decolou pendurado. Comecei logo a gravar. Todo mundo gritava. De início, pensamos: ‘O cara deixou o turista se ferrar sozinho’, mas depois houve consenso de que era o melhor que ele podia fazer para salvar a vida dos dois”. Após o acidente, Luiza, que tinha planejado um vôo de parapente, teve medo de saltar. “Acabei me acalmando e fiz um vôo maravilhoso de duas horas. Mas de asa-delta eu não vou de jeito nenhum. A velocidade é bem maior e acho muito perigoso”, afirmou ela. Curiosamente, após o acidente Kenneth Reyes voltou à Pedra Bonita querendo pagar a metade do preço, pois seu vôo tinha sido “incompleto”. Foi convencido a esquecer o assunto.